sexta-feira, 15 de março de 2024

GRATOS A JEFF DANZIGER

 
(Jeff Danziger, http://www.nytimes.com)

(Jeff Danziger, http://www.nytimes.com)

(Jeff Danziger, http://www.nytimes.com)

Andamos por aqui há largos anos e o cartunista nova-iorquino Jeff Danziger (JD) foi-nos acompanhando a espaços. Sem que, porém, tivesse ainda surgido a oportunidade para o saudar em particular, pelo seu talento artístico e pela coerência do seu posicionamento político-social; ficou, aliás, para a história da profissão o recorrente e peculiar sarcasmo de alguns dos seus trabalhos críticos em relação à presidência de George W. Bush. Já com 81 anos, JD surge-nos invariavelmente em jornais e publicações de toda a ordem e geografia, principalmente desde que passou a ser freelancer (antes, era presença habitual no “New York Times” e no “Washington Post”). Chegou hoje o dia, aproveitando a coincidência do processo eleitoral fake que decorre na Rússia de Putin para apresentar três imagens associadas ao dito e a mais dois odiosos políticos autoritários e autocentrados da atualidade internacional: Trump e Netanyahu. Um abraço de gratidão a Jeff!

quinta-feira, 14 de março de 2024

POLÍTICAS DE EDUCAÇÃO E FORMAÇÃO: A RELEVÂNCIA DO TERRITÓRIO (TAKE 1)

 

(A convite do Secretariado Técnico da Área Metropolitana do Porto estarei no dia 19 de março, pela manhã, nas instalações da AMP, a protagonizar uma intervenção no recém criado Conselho Consultivo Estratégico para a Educação e Formação. A intervenção procura traçar um contexto que seja útil aos propósitos de concertação e cooperação que estão associados à criação desse fórum. Como é meu hábito e método, estou a elaborar algumas notas de reflexão em torno das quais organizarei a minha exposição. O post de hoje sistematiza o primeiro grupo de reflexões, que designei de take 1.)

POLÍTICAS DE EDUCAÇÃO E FORMAÇÃO: A RELEVÂNCIA DO TERRITÓRIO

Introdução

Tendo em conta a missão que está atribuída à função consultiva do CCE, “um fórum de partilha e de trabalho colaborativo com o objetivo de contribuir para o desenvolvimento de atividades projetos e orientações que ajudem os Operadores de Educação e Formação a providenciarem as ofertas qualificantes que façam sentido para as Pessoas e para o Território” e “apoio à AMP na definição das suas linhas estratégicas de ação no domínio da Qualificação em geral, e do Ensino Profissional em particular”, organizei uma intervenção balizada por três dimensões de análise:

  • Primeiro, relembrando ao CCE algumas das características da AMP enquanto unidade territorial que interpelam o sistema de educação e formação;
  • Segundo, chamando a vossa atenção para o momento muito particular das questões da educação e da formação que o país enfrenta, de cuja caracterização encontramos no Estado da Educação 2023 recentemente publicado pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) reportado ao ano de 2022 um excelente diagnóstico;
  • Terceiro, a necessidade de tratar esse momento particular de transição do que eu chamo de “Sistema de Educação e Formação” em oposição ao conceito de Sistema Educativo que nos tem orientado até agora, no âmbito de uma articulação coordenada e frutífera com o território, neste caso com a AMP.

Em resumo, procurei elaborar um estado da arte que corresponda à apresentação do contexto que deve estar presente no trabalho do CCE AMP, onde ressalta a importância que atribuo à territorialização das políticas de educação e formação, sobretudo num quadro em que existam condições institucionais e de cooperação de recursos entre essas instituições, como aquelas que existem na AMP e que têm dado os primeiros passos no âmbito da racionalização da oferta de cursos profissionais no território.

Outros contributos, certamente inspirados por outras lógicas de abordagem que não esta que vos apresento, poderá o CCE mobilizar, ouvindo outras vozes e modelos interpretativos do momento particular de transição em que o sistema de educação e formação se encontra.

As especificidades de uma área metropolitana não convencional

Vários especialistas e estudos sobre o sistema urbano nacional convergem na ideia de que a AMP não é uma área metropolitana convencional, dada a sua diversidade e abrangência territorial que transcendem em muito o que vulgarmente se designa de Grande Porto. Partindo desse modelo não convencional de agregação de territórios, o que importa é destacar a sua relevância para efeito das expectativas que o seu desenvolvimento coloca ao sistema de educação e formação, na dupla perspetiva da resposta às aspirações dos indivíduos e ás necessidades das empresas, quer no que respeita às já instaladas, quer as referentes à atração de novo investimento empresarial e à importância que as qualificações que podem ser oferecidas assumem nessa atração.

Várias dimensões podem ser destacadas para assinalar essa relevância:

  • Em primeiro lugar, o peso económico deste território, medido seja pela relevância do produto aqui gerado, seja pela magnitude do emprego;
  • Em segundo lugar, a localização na AMP das principais infraestruturas de suporte à competitividade e internacionalização da região Norte (sistema aeroportuário, atividade portuária e potencial de consolidação de um hub da economia azul a que o Porto de Leixões pode ambicionar, às quais se podem adicionar instituições culturais de grande expressividade nacional e já fortemente internacionalizadas. 
  •  Em terceiro lugar, a coexistência de uma concentração de serviços de grande expressão, incluindo os intensivos em conhecimento, com uma base industrial ainda muito robusta e diversificada, que advém da abrangência territorial não convencional atrás referida;
  •  Em quarto lugar, a sua transformação recente em placa giratória do turismo da Região, sob o lema de Porto Norte de Portugal;
  •  Em quinto lugar, os ativos de grande relevância do sistema regional de inovação Norte que estão localizados na AMP, dada a magnitude do sistema universitário e politécnico aqui representado e a maturação progressiva do ecossistema de instituições e infraestruturas de base tecnológica existente no território;
  • Em sexto lugar, a grande expressão de corredores ecológicos e de mais valias ambientais que continuam a caracterizar o território da AMP na sua abrangência.

Com esta diversidade, o território da AMP emerge como um espaço em que uma grande parte dos desafios das transições digital e energético-climática vão ser travados, com as consequentes implicações em matéria de procura de qualificações e competências e obviamente em termos do matching necessário com a oferta existente e a promover.

Neste cenário, defendo que a questão do peso económico e demográfico de um território como a AMP não se imporá por si só na resposta às necessidades de qualificações para sustentar a sua dinâmica económica, cultural e social. Nas condições de transição em que o sistema de educação e formação se encontra, esse peso económico, demográfico e institucional terá que ter ao seu dispor condições adequadas e pertinentes de territorialização dessas políticas. É nesta linha que interpreto a criação do CCE-AMP para a educação e formação e a prática até agora desenvolvida em matéria de regulação da oferta de ensino profissional.

 

MAIS DESPESA EM DEFESA

Um gráfico que não carece de grandes explicações por ser bem elucidativo quanto à dilemática encruzilhada com que se defronta o futuro do modelo social europeu face às crescentes exigências de uma defesa própria e eficaz (guerras e ameaças obligent...). Um ajustamento que será necessariamente marcado pela dor, tanto mais quanto, se não se basear em cortes de despesa (sobretudo social), terá de passar por mais impostos e/ou mais dívida.

quarta-feira, 13 de março de 2024

SOBRE A VARIÁVEL “PLACES THAT DON’T MATTER”

 


(Compreensivelmente ou talvez não, vive-se já um afã de procurar explicações para a explosão do Chega e para as variâncias que o seu voto apresentou, máximos expressivos no Algarve e valores abaixo dos 18% em muitas  vezes de voto por este país fora. Este afá talvez fosse desnecessário se tivéssemos com tempo combatido a tese do excecionalismo português nesta matéria, como se fôssemos uma terra abençoada sabe-se lá por quem (ver crónica de Daniel Oliveira no Expresso digital). O Amigo sempre atento a este espaço António Oliveira das Neves relembrou-me a tese do altamente cotado na Comissão Europeia (sobretudo na DG da Política Regional), Andrés Rodríguez-Pose, que associa o populismo na suja expressão territorial aos “lugares a quem ninguém concede atenção, os tais “places that don’t matter). Dediquei em 13 de junho de 2023 um post a esta tese, o que prova que a minha preocupação antecipou toda esta onda de procura de explicações para a carga de trabalhos que será lidar no Parlamento e na esfera pública com a corja de Ventura e seus apaniguados.  No meu último post, tentei mostrar que uma das dificuldades de explicação da complexidade da explicação do populismo reacionário que se apresenta como voto de protesto antissistémico reside no facto de se tratar de um fenómeno com elevada plasticidade de adaptação e de assunção de formas novas em função dos contextos sociais e económicos em que irrompe. Por isso, não fiquei especialmente agradado com a profundidade das relações de causalidade que suportariam a tese de Pose, cuja complexidade está muito para além, em meu modesto entender, de umas correlações apelativas e suscetíveis de mapeamento. Assim, penso que por exemplo que para explicar a erupção do VOX e do CHEGA em Espanha e Portugal poderemos precisar de lentes diferentes, embora beneficiando de uma primeira explicação global do fenómeno para a qual a tese de Pose está mais talhada. Posso dar um exemplo. Na vizinha Espanha, há um exemplo sagrado de terra a quem ninguém daria atenção política, perdida lá para os interiores da região de Aragão, onde tive uma experiência de avaliação. Neste caso, a insatisfação Terueliana deu origem a um partido político que chegou a ter assento parlamentar e que não seguiu as vias da sedução espanholista do VOX. Isto de combinar a identidade aragonesa com o castelhanismo é coisa difícil de consumar e viu-se.)

Mas será que a tese dos lugares a que ninguém concede a devida atenção será para deitar fora? Não, nem por sombras. Mas o próprio Pose tão identificado com o paradigma da inovação-competitividade na política regional europeia deveria ser o primeiro a reconhecer que no quadro desse novo paradigma será cada vez mais difícil conceder oportunidades de revigoramento a territórios que perdendo energia demográfica, a não ser com o combustível da imigração a mitigá-lo, perdem obviamente capacidade de iniciativa empresarial. E, que eu saiba e os meus mestres assim me ensinaram, com o Schumpeter à frente, não existe inovação sem capacidade empresarial. Todo o paradigma da inovação e competitividade acontece e floresce em universos de rendimentos crescentes e nesses universos quem tem menos recursos perde sempre, por mais que douremos a pílula. Lembremos que esse paradigma penetrou as próprias políticas de coesão, etapisticamente consideradas, ou seja com a pretensãi de que por exemplo as infraestruturas, mesmo nesses lugares de perda da esperança deixaram de ter sentido.

Por isso, não posso deixar de sorrir ironicamente quando vejo um guru que tanto influencia a Comissão Europeia estar a dissertar sobre lugares de desesperança que a própria política regional, iluminada pelo paradigma da inovação-competitividade, ajudou a aprofundar, inexoravelmente, como se fosse possível encontrar fontes de inovação e competitividade em tudo que é lugar.

Creio que o Daniel Oliveira está cheio de razão quando refere que para explicar fenómenos complexos teremos de abandonar o afã das respostas rápidas e resistir à falsa simplicidade dos argumentos.

O que espanta na votação do Chega é a sua disseminação territorial, incluindo áreas urbanas de grande densidade. Esta evidência justificaria que pelo menos acrescentássemos a dimensão de “people that don’t matter” ( as pessoas a quem ninguém concede atenção). O que significa que a dimensão compósita da explicação tem de ser mais cuidada. E também o peso explicativo da relação ”votação Chega e peso da imigração parece não funcionar do mesmo modo, a não ser que nos movimentemos no domínio das perceções falsamente construídas, como ficou demonstrado do caso do BREXIT. Por isso, se tivesse idade para me abalançar a um projeto de investigação de largo fôlego daria mais atenção às condições em que se formam as perceções políticas e não exclusivamente à procura de uma racionalidade que muito provavelmente é muito incompleta e imperfeita.

Recordam-se do pretenso incidente numa ação de campanha do Chega em que ficou a ideia de que teria havido uns tiros a perturbar o evento. Houve um desmentido oficial de que o alarido não tinha nada que ver com tiros. Ora, apesar de ter ficado claro que a explicação era falsa, as redes sociais próximas do Chega vomitaram permanentemente a ideia de que a campanha tinha sido objeto de agressão e violência. É também neste plano que as perceções políticas que conduziram à explosão do Chega foram construídas.

Referi há pouco que a tese dos “lugares que não interessam” não é para deitar fora. Se a quisermos trazer ao mundo da investigação séria e racional há um caminho incontornável. Trabalhar e aprofundar o conceito de justiça territorial.  Basta pensar nos nomes e obras que temos à nossa disposição para trabalhar o conceito de justiça social (Rawls e companhia) e comparar com o que temos (com as devidas desculpas e vénia a Jordi Borja) para perceber do que estou a falar.

Obrigado ao AON por este pretexto.

 

A ÚLTIMA CARTADA DE BRETON

tweet acima constitui objetivamente uma maldade pública dirigida a Ursula von der Leyen (UvdL) por parte do ambicioso comissário francês e vice-presidente da Comissão Europeia (CE), Thierry Breton (TB). Questionando a representatividade de UvdL no seio do PPE com base numa aritmética discutível (dos 801 delegados ao Congresso de Bucareste apenas terão votado nela 400, pese embora estes corresponderem a mais de 80% dos 499 votos expressos) e de um modo assaz sibilino (entre um est-il possible de (re)confier la gestion de l’Europe ao PPE pour 5 ans de plus? e um le PPE lui-même ne semble pas croire en sa candidate), TB parece estar a queimar os seus últimos cartuchos em relação à pretensão que teria de suceder a UvdL em nome de uma negociação dos lugares europeus que permitisse aos liberais do chamado “Renew” aceder à presidência da CE, tanto mais que já se sabe que será Valérie Hayer (que atualmente lidera o grupo no Parlamento Europeu) a candidata escolhida por Macron para ser a francesa que integrará o triunvirato que dará a cara pela plataforma liberal (EDP, ALDE e Renaissance) às eleições de junho (o que significa, na prática, o abandono pelo grupo de uma disputa direta nos termos da chamada Spitzenkandidat road). Custa a crer que TB, inteligente e habitualmente estratega, se tenha prestado a um tiro desesperado de pólvora seca ― o futuro dirá! ― mas o certo é que, no que toca à Comissão, les jeux sont faits...